Canto de Página
Por falar em leitura...
Pedro Moreira
Professor de Português, revisor, consultor,
autor dos livros “Casos & Coisas do Pará Antigo”,
“Cronicontos” e “O Pássaro e a Dona & Outros Textos”.
Com certo orgulho, declaro ter vivenciado situação semelhante nos meus tempos de rapazinho, guardadas as proporções para épocas tão diferentes. Acontece que, sendo um assíduo leitor de histórias em quadrinhos (Gibi, Guri, Superman, Vida Juvenil), freqüentava também o paraíso da grande literatura, guiado pelas mãos de Machado de Assis, José de Alencar, Castro Alves, Graciliano Ramos, Monteiro Lobato, Grahan Greene, Guy de Maupassant, Robert Louis Stevenson...
Hoje me admiro da naturalidade com que assimilava coisas tão díspares como a insinuação de adultério contida em “Dom Casmurro” e o fantástico poder do Capitão Marvel, capaz de pulverizar, num simples murro, um meteoro vagabundo a caminho da Terra. Conclusão: a avidez por leituras criativas, fosse qual fosse a sua qualidade ou nível, talvez justificasse a estranha conciliação entre parâmetros tão diferentes e conflitantes.
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Por falar em leitura, tenho um episódio curioso para contar. Aluna minha pediu-me que a ajudasse na escolha de um presente para o pai. Desejava uma lembrança fora do convencional.
— Qual a profissão de seu pai? — foi minha primeira pergunta.
— Papai é um simples carroceiro, mal tem o curso primário, feito na roça.
Quis saber ainda:
— Qual a análise psicológica que você faz de seu pai?
— Meu pai é muito amoroso com a família, muito religioso, freqüentador de igreja... Ah, e muito inteligente!
— Ótimo! Então lhe sugiro dar a ele um livro... Que tal uma camisa e um livro? Uma bela mistura do convencional com o original...
Ela encarou-me com um olhar de espanto:
— Mas, como, professor? Meu pai ler um livro... Sei não...
— Dê a ele um livro de fundo religioso, de leitura fácil. Por exemplo: vida dos santos, principalmente daqueles que não têm sossego lá no Céu, solicitados a toda a hora, dia e noite...
Ela achou graça na brincadeira e notei-lhe nos olhos a alegria de ter achado a chave para seu problema. Dias depois, ela me revela:
— Professor, sua sugestão foi genial. Veja: papai trabalha duro como carroceiro, o dia todo. De tardinha, volta para casa, toma seu banho, janta, apronta-se e vai rezar na igreja próxima. Volta, senta-se no sofá da sala e retoma a leitura do livro que lhe dei, “A Vida dos Santos”. Ele o mostra a todo o mundo, fazendo questão de destacar minha dedicatória. Você não imagina como isto me faz feliz!
Não é à toa que vivo pregando: livro é o mais nobre presente que se pode dar. Agrada a gregos e troianos. É só ter o cuidado em não ofertar a uma circunspecta dona de casa algo como “Aprenda jiu-jitsu em quatro lições” ou “Quitutes de Dona Benta” a uma saradíssima top model, tipo Giselle Bündchen...